Napoleão e o envelope

Assim como muitos e muitos compatriotas meus, fiz o que pude para acompanhar o julgamento, ocorrido no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que poderia cassar ou não a malfadada Chapa Dilma-Temer, para mim a mais corrupta da história brasileira, quiçá da história mundial. Todos já sabíamos que seria um grande jogo de cartas marcadas, uma apresentação quase circense, inclusive já até se cantavam as pedras, no transcorrer da semana, de quem votaria contra e quem votaria a favor da cassação.

Fiquei impressionado com o esmero do ministro Herman Benjamin, relator do processo, ao descrever com minúcias todas as falcatruas que ocorreram na esfera eleitoral. Segundo ele, que só faltou “desenhar” os esquemas de propinas e de ilegalidades que contaminaram o pleito de 2014, havia provas robustas que fariam qualquer tribunal coerente e imparcial tomar a decisão digna que a Nação esperava. Mesmo com seus argumentos fortalecidos e reiterados pelos corajosos magistrados Luiz Fux e Rosa Weber, que deram um show de conhecimentos, didática, ética no serviço público e compromisso republicano, o relator foi derrotado pela empáfia e pela flagrante e assombrosa condescendência dos demais colegas. Sobre os ministros que votaram contra a cassação, para não me exaltar muito direi apenas que devem viver em uma realidade paralela. Quanto a Gilmar Mendes, presidente do TSE, esse é hors concours. Escandalizou-nos novamente, devido ao ego inflado, com pérolas da mais alta prepotência e falta de senso de ridículo.

Enquanto brasileiro, senti-me profundamente envergonhado no final do julgamento, não por conta do resultado, que já sabíamos tristemente com antecedência, mas pelo fato de estarem tentando nos carimbar com rótulos de idiotas, de palhaços, por mais uma ocasião. O que dizer de um tribunal que em tese foi criado, dentre outras coisas, para se preocupar com problemas de aplicação das normas jurídicas observados durante o processo eleitoral, que se faz de avestruz amedrontado no frigir dos ovos? Tá tudo errado, mas tá tudo bem, resumindo.

Não obstante todas as falas ríspidas, as discussões acaloradas, as incoerências e dissimulações, o episódio protagonizado pelo do filho do ministro Napoleão foi, no mínimo, esquisitíssimo. Seria até hilário e ridículo, se não fosse profundamente estranho. O sujeito vai até um tribunal, durante um julgamento de grande importância para o Brasil (pelo menos assim pensávamos), não liga para a vestimenta conveniente para lá adentrar, e, ainda por cima, tem por objetivo entregar um envelope misterioso para o paizão, que teve de sair do plenário da corte por longos minutos. A coisa foi tão séria, que o excelentíssimo presidente do TSE teve de ir acompanhá-lo, deixando o relator a expor seu voto para o que restou dos magistrados.

Quando retornou finalmente, mostrou-se indignado porque a nossa imprensa estava presente em peso e prestando atenção nos mínimos detalhes, tanto que publicou imagens que de início davam conta de que um homem teria feito o ministro “abandonar o posto” para lhe entregar um envelope suspeito. Ora, será que o sr. Napoleão ‘Cabeleira’ Maia é ingênuo o suficiente para não perceber que, na atual conjuntura do país, qualquer coisa soa à opinião pública como algo escuso e feito por debaixo dos panos?

Tudo esclarecido posteriormente pelo magistrado, que aproveitou a ocasião para esbravejar contra a mídia, contra as delações premiadas e, num rompante de ódio, até invocou a ira do profeta (seria ele integrante do ISIS?). Tratava-se de um singelo envelope com fotos da neta dele, só isso. O filhão deve ser daqueles que não gosta dessas coisas modernas, não liga para internet, e não tem e-mail e nem celular com aquele tal de whatsapp. Consequentemente, por conta disso, fez questão de entregar pessoalmente as imagens ao papai.

Explicou, mas com a devida vênia, não convenceu muita gente.

Sobre Mauro Blanco

Sou carioca da gema, morador da Zona Oeste, tricolor, bacharel e mestre em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e servidor concursado da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro. Já atuei como Oficial Temporário no Exército Brasileiro, na Companhia Municipal de Limpeza Urbana (como Subgerente na Gerência de Vetores), na Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (como Coordenador de Controle de Vetores, Coordenador de Vigilância Ambiental em Saúde e Diretor do Centro de Vigilância e Fiscalização Sanitária em Zoonoses Paulo Dacorso Filho), e na Secretaria Especial de Promoção e Defesa dos Animais, instância pertencente à Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, como Subsecretário.
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Uma resposta para Napoleão e o envelope

  1. Carlos Alberto Azeredo disse:

    É isso Mauro!!!Um escândalo!!!
    Todos já sabíamos do fim dessa encenação… Mas nunca conseguimos antecipar a frustração que nos domina quando o espetáculo termina de fato…
    E ainda há quem diga que nossas instituições são fortes… Inocentes!! Forte mesmo é o dinheiro que alimenta o interesse privado dessa escória que se auto intitula defensora do interesse público… Triste… Lamentável…

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