Escória da sociedade

Serenidade no olhar de quem não recebe um centavo de traficante e que dorme suas noites de sono como ninguém. Essas palavras não são minhas, vieram de um amigo que é policial militar do Estado do Rio de Janeiro, numa publicação que fez recentemente no Facebook. Lá, há imagem dele próprio em frente de viatura blindada famosa por aqui, um Caveirão.

Para nós, cidadãos que vivemos acuados numa espécie de estado de sítio não declarado, onde o governador pouco ou nenhum prestígio tem, escutar algo corajoso e sincero assim vindo de um policial é algo que ainda nos faz sonhar que existe esperança de que um dia sairemos desse enorme buraco. Não é toda corporação, óbvio, que se bandeou para a fatia podre. Quem é honesto, quem não é um mero bandido travestido de agente da Segurança Pública, e aqui não se resumem apenas os militares, deve resistir e lutar para que os canalhas que lá ainda estão sejam afastados – e presos – paulatinamente.

Há dois dias uma operação complexa, batizada de Calabar, prendeu dezenas de policiais militares, por conta de uma investigação que culminou com a expedição de quase duas centenas de mandados de prisão, incluindo de traficantes. A maioria dos PMs investigados está nos batalhões de São Gonçalo (7º BPM) e de Niterói (12º BPM).

Fico imaginando a situação de muitos profissionais decentes, que como meu amigo saem de casa sem ter certeza de que voltarão, que sustentam suas famílias com soldos minguados (quando não atrasam…) e que fazem seu trabalho respeitando e protegendo os cidadãos de bem. Inúmeras vezes encaram essas mesmas pessoas, que pagam seus proventos, com vergonha pelo que seus “colegas” fizeram de errado, algo noticiado praticamente todos os dias pela Imprensa. Pior do que isso só mesmo atuar num conflito, por exemplo, com um companheiro de farda ao seu lado, que no fim das contas recebe o chamado “arrego” de bandidos, que empresta armamento para assaltos e homicídios, que faz escolta para os “bondes”, e que até, pasmem, vende drogas ilícitas em bancas das favelas se fazendo passar por “vapor” do tráfico, como são chamados os que comercializam diretamente com os usuários. Servir com um criminoso fardado, com essa escória, certamente é saber que pode levar um tiro pelas costas, numa incursão qualquer, se for contrário ao pensamento dele e atrapalhar seu “negócio”. É estar constantemente na dúvida, numa angústia monumental. Haja preparo psicológico, meu camarada, para viver esse eterno “dormindo com o inimigo”!

Para mim, tudo isso é reflexo da falta de comando e de bons exemplos em todas as esferas de governo. Não podemos nos esquecer de que o Brasil é dirigido há muito por organizações criminosas que mentem deslavadamente, que se ajudam mutuamente, que vagueiam numa promiscuidade absurda entre os Três Poderes, e que delinquem, no mínimo, extraindo com a corrupção desenfreada os recursos fundamentais para a educação, a saúde, a segurança, as obras, etc. Vivemos numa democracia de mentirinha, onde somos obrigados a votar, onde a legislação favorece de forma flagrante os poderosos e onde muitos pensam que há correntes políticas que verdadeiramente querem fazer o país avançar. A inversão de valores impera e não vejo, pelo menos até onde a vista alcança, alguém ou algum grupo ideológico que tenha capacidade, honradez e disposição suficientes para mudar esse quadro atual nefasto.

Enquanto isso, num cenário em que o Estado do Rio de Janeiro vai seguindo à deriva e os servidores sem salário, o ex-governador, chefe da quadrilha de parasitas que nos espoliou até quase a morte, está na Cadeia Pública José Frederico Marques, no bairro de Benfica, quase um hotel três estrelas. Mesmo quando estava no Complexo Penitenciário de Bangu, já recebia visitas à noite, entregavam-lhe encomendas diversas a qualquer hora, tomava banhos de sol quando tinha vontade e em períodos além dos permitidos nos regulamentos internos da carceragem, e, como se não bastasse, deixou escapar para a mídia, através de sua assessoria igualmente mequetrefe, que estava muito deprimido, que chorava muito… Ora, mandá-lo à merda seria muita delicadeza da minha parte. Deprimidos estamos nós, seu Cabral. VTNC.

Sobre Mauro Blanco

Sou carioca da gema, morador da Zona Oeste, tricolor, bacharel e mestre em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e servidor concursado da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro. Já atuei como Oficial Temporário no Exército Brasileiro, na Companhia Municipal de Limpeza Urbana (como Subgerente na Gerência de Vetores), na Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (como Coordenador de Controle de Vetores, Coordenador de Vigilância Ambiental em Saúde e Diretor do Centro de Vigilância e Fiscalização Sanitária em Zoonoses Paulo Dacorso Filho), e na Secretaria Especial de Promoção e Defesa dos Animais, instância pertencente à Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, como Subsecretário.
Esta entrada foi publicada em Diversos e marcada com a tag , , , , , , , , , , , , , , , . Adicione o link permanente aos seus favoritos.

3 respostas para Escória da sociedade

  1. Carlos Alberto Azeredo disse:

    Prezado, Mauro,
    Compartilho integralmente de suas inquietações, mas não sei até onde irá a nossa capacidade de indignação… É Presidente, é Governador, é Prefeito, é Senador, é Deputado, é Vereador, é ministro, é juiz, é policial, é flanelinha, é gatonet, é trânsito pelo acostamento, é furto de energia e de água, é combustível adulterado, é o calote no condomínio, é o atestado falso, é o estacionamento na vaga de idoso, é a cola na prova, é o velho jeitinho brasileiro e a cultura de sempre levar vantagem em tudo… Nossa sociedade está a beira de um colapso… Difícil!!! Onde fica o “botão de reiniciar”?

  2. Leonardo Curvello de Castro disse:

    A força das instituições no combate firme para a manutenção do Estado.

    Assim vejo as ações, muito bem descritas aqui. Sabemos que a violência é escamoteada nos gabinetes através da pressão política sobre os gestores e demais servidores públicos quando, por exemplo, uma vereadora diz em bom som: “é por isso que fiscal leva tiro na rua”. Nunca esquecerei destas palavras, as quais foram imediatamente rebatidas porque meu pai me disse, ainda quando menino: “não leve desaforo para casa”. A assimetria demonstrada que não se alinha e não se alia à violência. Essa violência atrelada à corrupção sordidamente instalada no poder público. Compreendamos a violência como um complexo esquálido de conflitos de interesses e chegaremos à vários tipos de escravidão que alimenta a violência e dela se serve. Ser o elo solto nesta cadeia é talvez uma condição de vantagem porque há o Político que como “um cão, luta por seu osso” da mesma forma que o traficante força a violência das populações da comunidade. Resultados da violência: multidão irada, ônibus queimado, lojas saqueadas e propriedades destruídas. Mas as circunstancias que provocam? Quem debate sobre isso na Câmara dos Vereadores? Por outro lado, através do raciocínio lógico, deve-se observar o combate firme das instituições na fiscalização de ilícitos.

  3. Luis Carvalho Cordeiro Dias disse:

    Meu querido amigo, eu fico tão abismado quanto você diante desse cenário pior do que horrível no qual estamos vivendo há tempos. Gostaria no entanto de comentar o quinto parágrafo, acrescentando que nada disso teria sido possível se fôssemos – generalizando, é claro – um povo tenaz, de fibra, idealista, patriota e, principalmente, honesto. A corrupção e a desonestidade, guardadas as suas devidas proporções, começam aqui em baixo com, por exemplo, os tão comentados “jeitinhos brasileiros”, que todo mundo gosta – generalizando mais uma vez – e tem sido aqui e ali demonstrado diariamente para quem quiser ver! Como queremos exigir dos governantes, por nós eleitos, se não somos exemplo para aquilo que exigimos? Está passando da hora de o povo mudar – em muito – vários conceitos que, infelizmente, já estão na massa do sangue.

Deixe uma resposta para Leonardo Curvello de Castro Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *